A Super Tuesday passou e agora aproximadamente 30% dos estados já votaram e mais de 25% dos delegados em disputa serão distribuídos entre os candidatos, entre democratas e republicanos. Como é costume, a Super Tuesday é um momento crítico para as campanhas: pela primeira vez depois de meses o jogo de expectativas criado por desempenhos e possibilidades dos primeiros estados é substituído pela contagem fria de delegados.
E sob esse ponto de vista, não há como afirmar que Hillary Clinton e Donald Trump não são os favoritos para a nomeação. No entanto, os motivos (e os níveis) do favoritismo de cada um são bastante diferentes; assim como as dúvidas que permeiam ambas as campanhas. O que é notável: seus adversários não devem desistir tão cedo – ao contrário, é provável que sigam em campanha até junho, quando acabam as primárias. Vejamos em detalhes.
Democratas: a vantagem insuperável
Conforme previmos no guia para a Super Tuesday democrata, Hillary Clinton teve uma grande noite. O único estado sulista que Clinton não venceu foi Oklahoma (que é um estado “de fronteira”, podendo ser considerado parte também do Meio-Oeste), mas compensou essa derrota ao vencer Massachusetts. Bernie Sanders, conforme previsto, venceu com vantagem absurda em seu estado, Vermont, e ganhou também os caucus de Minnesota e Colorado.
Muito pouco para reverter a expectativa, considerando a vantagem de Clinton em cada estado: 29 pontos na Virginia, 32 no Texas, 34 no Tennessee, 36 no Arkansas, 43 na Georgia e quase 80 pontos no Alabama. As vitórias de Sanders são boas para manter a campanha em andamento e continuar chamando alguma atenção para os assuntos. Bernie ultimamente diz em todos os discursos que não se trata apenas de vencer uma eleição, mas de discutir assuntos fundamentais para o país.
A contagem de delegados ainda não acabou, mas Clinton obteve pelo menos 150 delegados a mais que Sanders, conforme previsto. Como todas as disputas democratas são proporcionais, o senador terá muita dificuldade para encontrar margens de vitória que permitam superar a vantagem da ex-primeira dama. Na maioria dos próximos estados, o eleitorado negro é bem maior do que nos estados que deram vitória a Sanders e a vantagem de Hillary nesse grupo de votantes é aparentemente inexpugnável, assim como entre hispânicos.
Republicanos: a dificuldade de vencer uma minoria
Donald Trump é o favorito disparado. Faz todo sentido projetar hoje que o bilionário enfrentará Hillary Clinton em novembro. Dos quinze estados que já votaram, Trump venceu dez e ficou em segundo em quatro (sua única terceira posição foi em Minnesota, primeiro e único estado até aqui vencido por Marco Rubio). Porém, ao mesmo tempo não faz sentido até agora entender como Trump consegue ser favorito comandando uma minoria que não cresce muito há meses.
A estranheza não é devida apenas ao fato de Trump ter dito e feito coisas que normalmente acabariam com uma candidatura sem perder apoio, ou por causa de sua improvável elegibilidade contra Clinton ou Sanders em novembro, ou por suas posições políticas altamente imprevisíveis. O grande fator que torna a candidatura Trump inacreditável mesmo quando sua vitória parece enorme é o fato de que aproximadamente metade dos eleitores republicanos o rejeita de modo veemente.
O grande desafio de ontem é entender vitórias e derrotas sob uma luz não guiada somente pelas expectativas e sim pelos fatos. A Super Tuesday poderia ser a coroação de Trump se ele obtivesse 50% dos votos no Alabama, ganhasse quase todos os estados (fora o Texas) e conseguisse mais de 300 delegados. Isso não foi obtido – Trump venceu 7 dos 11 estados, mas não chegou perto da maioria simples em delegados. A projeção mais acurada, feita pelo Upshot do New York Times, o tem com 245 a 250 delegados, algo próximo do piso que atribuímos a Trump no guia republicano para Super Tuesday.
Por outro lado, Trump perdeu muito mais para Ted Cruz (vencedor no Texas, em Oklahoma e no Alaska) do que para Rubio, e essa é sua grande vantagem: a Super Tuesday era o grande dia para Cruz devido aos vários estados sulistas com eleitores evangélicos e mais conservadores. Seu bom resultado ajuda Trump de duas formas. Primeiro porque mesmo que Ted Cruz supere expectativas e comece a ir melhor em estados do Norte e do Meio-Oeste, o senador texano é quase tão inaceitável quanto Trump para muitos no partido, o que impede consolidação a seu favor. Segundo, porque Rubio não tem argumentos para sugerir a saída de Cruz pelo menos durante uma semana e provavelmente até dia 15 de março.
Marco Rubio precisava de duas vitórias difíceis: sair com mais delegados do que Cruz e forçar Kasich de modo inquestionável a retirar sua candidatura. No primeiro caso, não chegou perto: deverá ficar com metade dos delegados de Cruz na Super Tuesday e ficou em terceiro na maioria dos estados. E embora Kasich não tenha nenhuma chance real de obter maioria de delegados, seus resultados em Vermont e Massachusetts lhe deram algum fôlego para tentar algo em Michigan na próxima semana e conquistar Ohio, o estado que governa, no dia 15.
Ainda há estratégias que, funcionando, levam a uma vitória de Rubio ou Cruz. Mas nenhuma delas será mais realista – considerando as evidências atuais – do que projetar a nomeação de Trump. A possibilidade de uma Convenção Nacional Republicana contestada também cresce, mas essas opções de cada campanha precisam ser tratadas em outro texto. Afinal, as primárias continuam, e na próxima semana outros oito estados, além do território de Porto Rico, terão votado.