O terceiro estado a votar nas primárias do Partido Republicano tem sido considerado decisivo para as pretensões de inúmeros candidatos ao longo das décadas. A Carolina do Sul é um ótimo termômetro para avaliar o Sul dos Estados Unidos, sua região mais pobre e mais controversa historicamente. O que esperar da votação no sábado dia 20?
A história da Carolina do Sul
Uma das treze colônias originais dos Estados Unidos da América, a Carolina do Sul se formou a partir da divisão de um grande território, chamado Carolina em homenagem ao rei Charles I da Inglaterra em 1629. Durante a Revolução Americana, tornou-se independente da coroa britânica antes da Declaração de Independência e um dos estados mais importantes da união posterior, ratificada pela Constituição.
Com o tempo, a Carolina do Sul constituiu-se na maior liderança entre os estados do sul norte-americano, escravocratas e produtores de tabaco, açúcar e principalmente algodão. Andrew Jackson, único sul-carolinense a assumir a presidência, foi decisivo na formação do Partido Democrata, o maior defensor da “peculiar instituição” – ou seja, a escravidão – entre os estados sulistas. Partiu da Carolina do Sul a primeira declaração de secessão, em 1860.
Derrotado na Guerra Civil, o Sul viu-se obrigado a remendar uma sociedade agora sem escravos, mas não sem forte segregação e negação de direitos básicos à população negra. Durante quase um século os estados sulistas permaneceram sob a égide das chamadas leis Jim Crow, que instauravam uma situação similar ao apartheid sul-africano.
A Carolina do Sul foi palco de várias demonstrações pelos direitos civis nos anos 60, e como o restante do sul americano foi progressivamente abandonando o Partido Democrata. Hoje o estado é fortemente republicano: nos últimos 30 anos, foi governado por democratas por apenas 4. A última vez que um candidato presidencial democrata venceu no estado foi em 1976, quando Jimmy Carter – ex-governador da Georgia, estado vizinho – foi eleito.
Campanhas recentes
Em 2008, a expectativa dos democratas era que Hillary Clinton teria vantagem nos estados do sul contra qualquer oponente. Seu marido, Bill Clinton, foi considerado um ótimo presidente para os negros, que são parte expressiva do eleitorado da Carolina do Sul, ainda mais nas primárias democratas. Bill fora governador de um estado sulista, o Arkansas. Tudo parecia estar no caminho certo.
Exceto o surgimento da candidatura de Barack Obama. Um candidato negro e carismático tinha tudo para “roubar” parte preciosa do eleitorado clintoniano e vencer as primárias da Carolina do Sul. Bill Clinton cometeu então um grave erro: tratou o favoritismo de Obama no estado com desprezo, associando-o à candidatura de Jesse Jackson em 1988, como se fosse apenas um “candidato negro”. Isso não ajudou sua mulher, que perdeu a maioria dos estados sulistas nas primárias e teve de ceder a candidatura a Obama.
Do lado republicano, a última disputa foi em 2012. Após uma vitória clara em New Hampshire, o ex-governador de Massachusetts Mitt Romney esperava obter a confirmação de seu favoritismo para o desafio a Barack Obama em novembro daquele ano. Mas a Carolina do Sul decepcionou os partidários do presidenciável quando deu a maioria ao ex-presidente da Câmara de Deputados dos EUA, Newt Gingrich.
Na semana anterior à votação, Romney aparecia com larga vantagem sobre seus oponentes nas pesquisas. Mas na semana final, o jogo virou: Gingrich venceu Romney por 40% a 27%, levando quase todos os delegados em disputa e promovendo a ideia de que Romney não era um candidato inevitável.
Chances dos candidatos em 2016
Em 2016, a Carolina do Sul se tornou novamente importante. Do lado democrata, que fará suas primárias no dia 27, existe a expectativa de que Hillary Clinton garanta bastante vantagem sobre Bernie Sanders entre o eleitorado negro. Mas talvez a maior decisão esteja no campo republicano.
Donald Trump lidera as pesquisas com larga margem. O site FiveThirtyEight lhe dá 77-85% de chance de vencer no estado e prevê disputa acirrada entre Ted Cruz e Marco Rubio pelo segundo lugar. Mas as características do estado relativizam muito a questão.
A grande quantidade de eleitores evangélicos faz da Carolina do Sul um estado em que Ted Cruz e Ben Carson deveriam ir muito bem. Na verdade, Cruz deveria vencê-lo para ter um caminho plausível para a nomeação, considerando sua dependência do voto evangélico (sua maior força para a vitória em Iowa) e sulista. Carson deve abandonar a disputa após a votação no sábado caso não obtenha um resultado muito bom – deve ficar em quinto ou sexto, insuficiente para justificar a continuidade da candidatura.
Marco Rubio, após o desastre no debate em New Hampshire, não está focando tanto em vencer a Carolina do Sul, mas em finalmente tirar Jeb Bush da jogada. E é provável que consiga. Rubio obteve o apoio do senador Tim Scott e da governadora Nikki Haley, ambos representantes de minorias (Scott é negro; Nikki é filha de indianos) e tem aparecido bem nas pesquisas. Ficar próximo de Cruz no sul para Rubio é mostrar que é o melhor candidato para enfrentar Donald Trump, tanto para o eleitorado conservador quanto para o moderado.
Enquanto isso, Jeb Bush tentou tudo que podia, chamando seu irmão George W. Bush para fazer campanha no estado. No entanto, se as pesquisas estiverem certas, Jeb não terá motivo para acreditar ser possível a vitória depois de sábado, e será cada vez mais pressionado para abandonar a campanha e se unir ao esforço do establishment para derrotar Trump e Cruz.
O sistema de disputa republicano na Carolina do Sul dá 3 delegados por distrito (são 7) e outros 29 para o estado todo. Quem vencer em cada distrito, leva seus três delegados; quem vencer no estado como um todo leva os outros 29. Com uma vantagem tão grande, Donald Trump deve faturar todos os 50 delegados sul-carolinenses e aumentar ainda mais suas chances de ficar com a nomeação, apesar de toda sua rejeição.